sábado, 30 de dezembro de 2023

 Uma Estrela na Terra

  (à Maria Estrela Melo Jorge na ocasião do seu Doutoramento)

  Estrelas há muitas,
  No Céu.
  Na Terra,
  Não tantas assim.

  Mas há uma 
  Que brilha
  E se move como o vento.

  Que respinga,
  Mas sublinha,
  Com arte,
  A verde,
  A vermelho,
  A cinzento.

  Fala dialectos,
  Tem afectos.

  Entra de rompante,
  Mas elegante.

  Quando nasceu
  O nome surgiu marcante:
  Estrela!

  Hoje, no seu Doutoramento,
  Subiu da Terra
  Ao Firmamento.

  Que nos possa alumiar
  Nestes tempos,
  The Luar matreiro,
  Dos aprendizes
  De Feiticeiro.

  Com muitos parabéns e amizade de

  Fernando Fernandes, 14/12/1999
 

domingo, 30 de outubro de 2016

A Força


A força é um conceito,
Maneira de traduzir
O que vai no feito.
De induzir alterações,
Fazer avançar,
Iludir,
Ou regredir.

A força é persistência,
Crer nalguma coisa,
É paciência,
É insistência.

A força é delicadeza,
Subtileza,
Sensibilidade,
Amizade,
Não abdicar posições.

A força é ter intenções,
Opiniões,
Desagradar,
Afirmar,
E perguntar.

A força é amor,
Calor,
D'ambiente familiar.
Honestidade,
E humanidade.

A força é trabalhar,
Não ultrapassar.
Ver desigualdades,
E maldades.

A força é perdoar,
Não esquecer
Intenção
Que a animou.

A força é talhar forte,
Olhando a sorte
D'quem estimulou.

                                        (Fernando Fernandes, 2000)

É Possível Renascer? Uma pincelada na tela do desespero

Nota: Escrito em 1993. Entretanto, a Biotecnologia e interação Indústria-Universidade em Portugal evoluíram positivamente.


Lisboa, Jardim de St. Catarina.
Tarde fria de Janeiro.
Sol poente cor-de-rosa.
Complexo da Lisnave,
Cristo- Rei, em frente.
A meus pés Tejo barrento,
Outrora golfinhos a dançar.
Canichos as caudas abanando,
Par de namorados se beijando.

Pergunto-me:
É possível renascer?
É possível renascer da situação actual?

Da situação infernal
Onde grupos,
Ditos "dos Maiores",
Gerem e ditam,
Em nome da Democracia,
Os destinos dum Povo
Com oito séculos de História,
Colados a conceitos e ideias feitas,
Sem originalidade,
Plagiando e sujeitando-se
Às leis duma Economia recessiva,
Teoricamente progressiva,
Mas sem saída em perspectiva!

Não é baseada na honestidade,
Na igualdade de oportunidades,
Na pureza do espírito
E na inteligência!
Mas na selvagem concorrência,
Pouco mais!

Olhe-se ao Mercado,
À Política,
À Ciência.

Tudo é ultrapassar,
"Normalizar o passo".
Ser da C.E.E.,
A qual é
Traço orientador,
Não mais!

O que importa, por exemplo,
É ter abundância de "papers"
No curriculum.
Não importam os "makers"!
O que importa é o nome,
A jactância,
O abanar do penacho,
A quaisquer custos,
Não há lugar para os justos.
Importa é o inglório "tacho"!

É a cara da propaganda,
Na Rádio e Televisão.
É muito bem ser mencionado,
Ou mostrado.
Dá impulso!
E política posição!
E dinheiro!
E, aparentemente, progresso.

É muito bem ser referido
Pelo Ministro Tal, bendito!
Há, até, quem viva
Com esse único fito!
Que importa ser original,
Praticar ideias, tê-las em mente?
O que importa é copiar,
Dissimuladamente.

O que importa, por exemplo, é dizer
Há Biotecnologia,
Onde não há!
Há interação Indústria-Universidade
Onde, raramente, há!

O que interessa, afinal, é iludir!

É possível renascer?

É preciso ser menino,
Outra vez!
E beber o leite dourado
Com o coágulo fermentado
No seio da honradez!

No que digo,
Há melhoria da "raça" implícito,
Mas não é preciso
Matar,
Eliminar,
Destruir sonhos sobre-humanos.

É preciso reconhecer
O que há, em nós, do tal menino.
E amamentá-lo
Com Carinho,
Sem Parcimónia,
Com os Lábios,
Sábios,
Da Consciência
Que nos assaltará,
Mais cedo ou mais tarde,
Quer queiramos ou não,
Em noites tenebrosas
De Insónia
E de Solidão!
                            (Fernando Fernandes, Janeiro 1993)

sexta-feira, 28 de outubro de 2016

Falta-me o tempo

Falta-me o tempo
O dia tem 24 horas
Trabalho muito
Não gozo liberdade

O meu salário é imenso
Tem de ser a passo
Do Mercado
Vem dos contribuintes
Não tão astronómico
Como outros
De origem misteriosa

Da pobreza
Que grassa
Falta-me tempo
Para pensar nela

Falta-me tempo
Para gastar
O meu salário
Quanto acumulo?

É preciso estimular
A Juventude
Para certa visão
De empreendorismo

Falta-me tempo
Para atender a ética
Não para acumular
Qual o sentido?
Falta-me tempo para meditar

Outros trabalham muito
Ou mais do que eu
Bons profissionais
Mas sem o passo
Do Mercado
Falta-me tempo
Para os considerar

Como pago esta bica
Que sorvo a correr
Neste café de esquina?
Esqueci a carteira
Não o cartão de crédito
Aceitarão com NIF?
Porra de vida
Falta-me o tempo

sábado, 15 de outubro de 2016

Uma história...

Fédor Darapski nasceu em Karskod, Polónia, em 1774. Foi incorporado no exército russo aos 22 anos de idade e cedo participou num motim pelo qual foi condenado à morte.
Num momento de compaixão, a imperatriz Catarina comutou a sentença para prisão perpétua com uma ração de 1 kg de pão escuro e 1 jarro de água fria por semana.
A natureza generosa e indulgente das autoridades russas levou-as a reconsiderar, e Fédor foi libertado no dia dos seus 90 anos pois, afinal, o motim tinha sido um fiasco!

(em “Order and Chaos. Laws of Energy and Entropy”, S. Angrist and L. Hepler, Pelican Books, 1973)

A história é falaciosa, a não ser que:

- o pão russo da época fornecesse muito mais kilocalorias do que o pão actual.
- Fédor tivesse sido mais hábil a obter comida por outras vias do que foi no motim onde esteve envolvido.
- ao longo dos anos os contadores de histórias tivessem “dourado a pílula” reduzindo a quantidade de pão sentenciada.
- a unidade kg referida fosse mais do que duas vezes a convencionada presentemente.

Onde está a falácia?

- 1 kg de pão/semana teria fornecido < 400 kcal/dia.
- Mesmo que o peso de Fédor tivesse descido a < 40 kg, teria necessitado, pelo menos, de ~1200 kcal/dia para sobreviver se dormisse 12h, e durante as outras 12h estivesse acordado, mas sentado sossegadamente na sua cela.
- A 1ª Lei da termodinâmica, tal como outras leis da natureza, não tem exceções para o Homem.
- Um ser humano tem de consumir uma determinada quantidade de energia/dia para manter a temperatura do seu corpo, sustentar os seus processos respiratório e circulatório e construir e substituir os seus tecidos.

Note-se:

Hidratos de carbono, lípidos e proteínas são as substâncias que fornecem a energia
(através de reações de combustão) e quase todo o material necessário para sustentar a vida e construir os tecidos.

A 1ª Lei da Termodinâmica:

- O cientista:

“Energia fornecida = Trabalho interno + Trabalho externo”

- O poeta (António Aleixo):

“Quem trabalha e mata a fome
Não come pão de ninguém
Quem não ganha o pão que come
Come sempre o pão de alguém”

- O provérbio:

“Quem cabritos vende e cabras não tem de algum lugar lhe vêm”

domingo, 24 de abril de 2016

Recordando uma Professora de Ciências

Saia justa, salto alto, casaco com dois lados (num dia era o vermelho, no outro era o preto), ar aparentemente severo, voz bem timbrada (moderada por uma pastilha “Valda”), gesto de mãos em sintonia com a exposição dos assuntos, um perfume inesquecível, e uma didática memorável.

Assim era a nossa professora de ciências geográfico-naturais e de fisico-química no Externato D. Sancho II, Mértola (1956-62). Chamava-se Idalina, era farmacêutica, directora técnica da farmácia Godinho, e tinha estado anteriormente numa farmácia em Alcoutim. Ao que se diz esteve para ser minha tia por afinidade. Idalina rima com Mirtilina!...

O meu interesse pela física e pela química foi estimulado por ela. Ainda guardo, desses tempos, um frasco de água de cal usada para detectar CO2. Na farmácia Melo adquiri tubos de ensaio e alguns reagentes (por exemplo, licor de Fehling para detectar glicose) e uma retorta para a destilação da madeira (quase pegando fogo à casa!). E, para culminar, a tentativa de recarregar pilhas secas com o Zé Eduardo Rodrigues (“Cré”). Um “empreendimento” que resultou em falência total…
A verdade é que durante as minhas aulas de física e química, ao longo dos anos, a didática da professora Idalina vem sempre à minha memória.

sábado, 23 de abril de 2016

O Regresso de D. Sebastião

D. Sebastião voltou 
Envolto em nevoeiro
Armado pioneiro 
Salvador da Pátria 
Em dor
Num fosso

Não é mais o ingénuo moço
Frequentou o estrangeiro 
Filiou-se em seitas 
É curandeiro de muitas maleitas

É professor 
Cientista
Artista
Investigador

Domina as lideranças
A economia 
As finanças 
E a filosofia

É influente na política 
Dos independentes 
Confronta ministros e gabinetes 
Quase sempre ausente 
Na parada dos seus tenentes 
Quais paquetes! 
É “tu cá, tu lá”
Com Bruxelas
Conhece corredores
Janelas 
E gestores

É poliglota 
Pratica pelota com proletários
Ténis com turistas
Golf com empresários 
Natação com desportistas 
E gamão com coristas

Toca piano 
Monta a cavalo 
Pinta o pano 
Com traço abstracto 
Escreve poesia
Canta fado em noites de farra 
E sublimado com histeria

Perseguido p’las informações 
E mui comentado 
P’la garra 
Com que interpreta variações

Gosta de sexo 
Não lhe importa o nexo 
Ama por dissimulação 
Mão sobre mão
P’ra que vejam a encenação 
Do amor 
Com compreensão 
Amizade 
E vivência em comunhão

O tempo não existe p’ra D. Sebastião 
Passado, presente e futuro 
São p’ra ele uma ilusão 
Da percepção

O povo aclamou o seu regresso 
A democracia o seu ingresso

Eis senão 
Quando um moço imberbe 
Leitor insaciável 
Observador externo imparcial 
Filho dum general de D. Sebastião 
Desfechou ao Pai em tom coloquial 
Esta questão: 
- D.Sebastião move-se a grande velocidade 
Tem um cérebro contraído diminuído 
Sem igualdade na minha dimensão 
O dia dele tem fracções de segundo 
O meu tem horas, dias, anos 
Uma imensidão! 

Atalhou o general: 
- Acaba com a fantasia
Da reflexão
Precisas experiência da vida 
Vivida! 
Então
Aprenderás a magia!

O moço calou-se 
Mas fixou-se na sua questão 
E murmurou: 
- Um dia compreender vão 
Ler
Tem um tempo de horas, dias, anos 
De prazer 
Uma imensidão
Afinal D. Sebastião não existe 
É uma ilusão 
Da percepção